"Rough Sea at Etretat", Monet
Uma imensa sensação de vazio preenchia-o, na calma melancolia do entardecer.À beira-mar plantado, as ondas traziam-lhe ecos, recordações da conversa da noite anterior. Sete após sete, a espuma das vagas insistia em pintar de negro o quadro que ele pretendia claro...como uma tela pronta a receber as primeiras pinceladas.
Mais um semi-relacionamento-semi-assumido que resolveu terminar. Um semi-amor a que se tinha acostumado, mas que nunca tinha criado as raízes necessárias a um frondoso relacionamento.
Estaria semi-arrependido? Não. Tanto quanto a vida o tinha ensinado, não havendo certezas absolutas, estava semi-certo do rumo que tinha traçado e da decisão semi-difícil que tinha tomado. Pensar no bem comum, não se resume ao dia a dia e o semi-egoísmo da continuação da "paz podre", deu lugar ao semi-altruísmo de dizer "basta".
Junto a si, as pessoas passeavam, ignorando o que lhe ia na alma e pouco se importando com o seu estado de semi-nudez e aparente semi-consciência, de olhos postos na linha do horizonte.
Perto de si, os seus amigos construiam as suas vidas "a dois" - embalados pelo sopro da felicidade - ou já "a três", embalados pelo sopro da fertilidade. Por vezes, sentia-se algo estranho. Algo a meio caminho entre o último dos moicanos e o primeiro dos otários. Qualquer coisa entre a figura de resistente e a figura de urso, digamos.
Outras vezes, não. Apenas alguém que não gostava de se entregar a uma situação de conveniente semi-felicidade.
O vento frio empurrou-o de volta ao carro, onde a voz de Djavan o recordou da paisagem observada, apenas instantes atrás.
"(...)Amar é um deserto e seus temores,
Vida que vai na sela dessas dores(...)"
Ao sentir que o amor teimava em abandoná-lo, uma imensa sensação de vazio continuava a preenchê-lo, na calma melancolia do anoitecer.