Palavras que Brotam

25 janeiro, 2008

O2

"O pensador", Auguste Rodin

Ar! Precisava de ar fresco. Inspirou profundamente e procurou expirar na mesma medida, em vã tentativa de dar o mesmo destino à tristeza que o apoquentava. Instintivamente, procurou o bloco que jazia no fundo do porta-luvas do carro e recuperou-o, puxando-o para si e encostando-o à testa.
Espartilhado entre sensações e sentimentos contraditórios, estava incapaz de comunicar sem ser através da caneta, agora debilitada pela pronunciada ausência. Cansaço. Sentia um cansaço imenso, próprio de quem havia vindo a carregar o peso de uma culpa que não lhe pertencia, mas que - ainda assim - lhe faziam transportar. A fadiga tinha-se vindo a instalar em cada poro da sua pele, qual nuvem negra cobrindo o azul da espontaneidade...qual pedregulho esmagando o solarengo jardim de emoções em que havia dançado vezes sem conta com o seu par.
"Poderia um ateu sentir descrença?" O ridículo da questão que o assolou provocou-lhe um efémero sorriso...pouco mais que um mero e reflexivo esgar que logo voltou a dar lugar ao semblante esfíngico, compenetrado e ausente. A pressão da perfeição esmagava-o e um mar de palavras mitigadas no qual também já não conseguia navegar parecia engoli-lo. Era um pouco como se, por mais vento que soprasse na vela, nunca fosse suficiente para prosseguir viagem a contento dos tripulantes.
"Não deveria ser tudo mais simples, mais espontâneo, mais leve, mais...pacífico? Não deveríamos dar mais graças pelo muito que temos e não deitar tudo a perder pelo pouco que nos falta?", pensou. As palavras que se soltavam no bloco de notas não lhe devolveram resposta, apenas o espírito decidiu remexer o baú de memórias musicais e devolver à vida aqueles acordes e letra profusamente ouvidos em tempos.
Bingo! A música simples e despretenciosa, na voz rouca de quem escreve e canta como quem conta uma história, fizeram-no cerrar os olhos. Sem forças para continuar a navegar naquele mar de discórdia - em que ondas revoltas desconfiam da própria espuma que criam ao embater na embarcação - deixou-se ficar. Há momentos assim, em que o vento sossega, o motor pára, os braços doridos não conseguem remar mais e o barco...acaba por soçobrar ante o exigente oceano.
Como a areia que se esvai por entre os dedos, quando demasiado apertada...como o pássaro que escapa para longe quando não o deixam voar...como as palavras e os sentimentos sufocados, perante a pressão de mais e mais e mais, assim a Natureza - a humana e a outra - tem os seus equilíbrios e escapes. "E ainda há quem não perceba isto!", exclamou para si.
Estava a fazer-se tarde. Muito tarde. A temperatura havia baixado. Muito. Era tempo de regressar ao louco corropio do Mundo, à vida que não pára, à busca do santo graal chamado felicidade...com cuidado, para não entornar o cálice. Um passo em frente ou dois passos para trás?

ONE STEP UP, TWO STEPS BACK

"Woke up this morning my house was cold
Checked out the furnace she wasn't burnin'
Went out and hopped in my old Ford
Hit the engine but she ain't turnin'

We've given each other some hard lessons lately
But we ain't learnin'
We're the same sad story that's a fact
One step up and two steps back
Bird on a wire outside my motel room
But he ain't singin'
Girl in white outside a church in June
But the church bells they ain't ringing
I'm sittin' here in this bar tonight
But all I'm thinkin' is
I'm the same old story same old act
One step up and two steps back
It's the same thing night on night
Who's wrong baby who's right
Another fight and I slam the door on
Another battle in our dirty little war

When I look at myself I don't see
The man I wanted to be
Somewhere along the line I slipped off track
I'm caught movin' one step up and two steps back
There's a girl across the bar
I get the message she's sendin'
Mmm she ain't lookin' to married
And me well honey I'm pretending
Last night I dreamed I held you in my arms
The music was never-ending
We danced as the evening sky faded to black
One step up and two steps back"

Copyright © Bruce Springsteen (ASCAP)